O conceito de “fadiga digital” não é novo, mas a intensidade com que ele afeta a sociedade moderna alcançou níveis inéditos. Em um mundo cada vez mais mediado por telas, onde o lazer, o trabalho e até o descanso dependem de interfaces digitais, a exaustão mental coletiva se tornou uma epidemia silenciosa. O termo “brain rot” – ou “podridão cerebral” – recentemente eleito como palavra do ano pela Oxford University Press, encapsula essa realidade. Mas como as marcas podem se adaptar a um público tão saturado?
A banalização do extraordinário
Nunca estivemos tão conectados, e, paradoxalmente, nunca estivemos tão distantes de experiências significativas. O “doomscrolling” e a inundação de conteúdo superficial, como o fenômeno Skibidi Toilet no TikTok, ilustram como a internet transformou o trivial em viral. A consequência? Uma mente exaurida, incapaz de processar informações com profundidade, e um público cada vez mais exigente.
Casos como o de Jennifer Castro, que viralizou nas redes sociais em um episódio banal relacionado ao seu assento do avião, mostram como a superficialidade pode dominar os debates públicos, enquanto questões relevantes são rapidamente esquecidas. Essa dinâmica transforma o consumo digital em uma mistura de prazer fugaz e culpa persistente, um ciclo que afeta tanto consumidores quanto as marcas que tentam se conectar com eles.
A tensão entre relevância e ruído
No Brasil, onde 8 em cada 10 pessoas passam mais de quatro horas diárias conectadas, as marcas enfrentam um dilema: como captar a atenção de um público que já está saturado? Estudos de neuromarketing, como os explorados em A Lógica do Consumo de Martin Lindstrom, indicam que apenas estímulos sensoriais profundos e autênticos conseguem gerar uma resposta emocional verdadeira. Entretanto, a corrida pelo engajamento imediato muitas vezes prioriza o efêmero em detrimento do significativo.
Um exemplo positivo vem do Boticário, que criou a fragrância Egeo Melancia baseada em sugestões de consumidores no TikTok. Essa estratégia transformou uma interação virtual em uma experiência tangível e personalizada, mostrando que escutar os consumidores pode ser a chave para destacar-se em um mercado competitivo.
Entre Neuromarketing e a lógica de consumo
Em um contexto saturado de estímulos digitais, entender os desejos e motivações inconscientes dos consumidores tornou-se uma prioridade estratégica para as marcas. Martin Lindstrom, em A Lógica do Consumo, aprofunda-se nas nuances do neuromarketing, revelando como nossa mente subconsciente rege grande parte das decisões de compra. Ele argumenta que, mais do que persuadir o consumidor com anúncios diretos, as empresas precisam apelar aos sentidos e às emoções mais profundas.
Um exemplo emblemático mencionado por Lindstrom é o uso de estímulos sensoriais – como som e aroma – para reforçar memórias positivas associadas a uma marca. Em tempos de exaustão digital, esse tipo de abordagem pode ser decisivo para superar o “brain rot”. Ao criar experiências que apelam a múltiplos sentidos, as marcas não apenas captam a atenção em um ambiente saturado, mas também constroem conexões mais duradouras.
Outro ponto relevante do autor é sua análise sobre os “marcadores somáticos”, conceitos que conectam experiências emocionais passadas a escolhas futuras. Essa lógica sugere que, para capturar o consumidor moderno, as marcas precisam criar momentos que transcendam o valor imediato do produto. Em outras palavras, é necessário construir um significado emocional e cultural em torno de suas ofertas.
Portanto, em meio à era da superficialidade digital, os insights de Lindstrom oferecem um caminho para marcas que buscam se destacar: ao invés de competir pela atenção fugaz, elas devem focar na criação de experiências autênticas e memoráveis. Afinal, como o próprio autor destaca, “o futuro do consumo pertence às marcas que entenderem não apenas o que os consumidores compram, mas por que compram”.
Estratégias para um engajamento autêntico
Para as marcas que desejam prosperar na era da fadiga digital, o caminho passa por estratégias que priorizam autenticidade e conexão emocional. Aqui estão algumas práticas recomendadas:
Conteúdo que agrega valor: Invista em narrativas que ressoem com o público, indo além de campanhas publicitárias genéricas. Histórias que despertam emoção ou promovem reflexão têm maior chance de escapar do “lixo digital”.
Experiências multissensoriais: Produtos e campanhas que envolvem mais sentidos – como som, tato e até aroma – criam memórias duradouras e associam positivamente a marca à experiência.
Foco no consumidor como co-criador: Envolver o público no desenvolvimento de produtos, como no exemplo do Egeo Melancia, reforça a ideia de pertencimento e exclusividade.
Simplicidade na complexidade: Em tempos de excesso de informações, menos é mais. Mensagens claras, relevantes e diretas ganham espaço em meio ao ruído digital.
O futuro das relações marca-consumidor
O impacto do “brain rot” vai muito além de memes ou termos da moda. Ele exige que empresas reavaliem como se conectam com seus públicos, equilibrando inovação tecnológica com empatia humana. O desafio não é apenas criar campanhas ou produtos que chamem a atenção, mas que permaneçam relevantes em um contexto saturado.
Em última análise, o sucesso das marcas no futuro dependerá de sua capacidade de transcender o consumo imediato e construir experiências que alimentem não apenas a mente, mas também o coração de seus consumidores. Afinal, em um mundo onde o trivial parece reinar, o significado continua sendo a verdadeira moeda de troca.
Fonte: Linkedin / Gustavo Paganini / Digital Strategist | University Professor
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