fbpx

O Mapa Político Sul-Americano

A América do Sul é uma região composta por doze países, que historicamente foi considerada como o quintal dos Estados Unidos. Recentemente a ascensão econômica chinesa, somada à crises econômicas, conflitos internacionais e pandemia a colocaram, o território mais distante dos centros de poder

No campo político nota-se, nas últimas décadas, a alternância de poder baseada na dobradinha esquerda (progressista) e direita (conservadora), e que ambas mal conseguiram resolver os problemas da população, como a desigualdade social, falta de educação e saúde, somada à crescente onda de violência e do crime organizado.

Não bastasse isso, os governos em todo esse período não conseguiram uma integração regional sólida, cujas ideologias prevalecessem sobre as propostas. O Mercosul, proposto na década de 90, apenas mostrou nossa falta de articulação mundial, cujo fracasso evidencia a fraca liderança brasileira.

Os desafios para os próximos anos são imensos, que exigirão, não somente uma boa articulação entre os países sul-americanos, mas também projetos nacionais e não somente politicagem ideológica entre um grupo e outro, caso contrário ficaremos mais distante ainda do resto do mundo como estamos hoje.

Governos sul-americanos 2000-2024

A “onda rosa” nos anos 2000

Antecedentes

O fim da Guerra Fria nos anos 90 consolidou os Estados Unidos como potência única no planeta, e no ramo econômico nota-se a propulsão internacional do neoliberalismo com Ronald Reagan (Estados Unidos), Margareth Thatcher (Reino Unido) e Helmut Kohl (Alemanha), assim como a globalização nos anos 90 com a participação cada vez menos atuante na economia.

Nesse período, também, busca-se uma maior integração na região, com a criação do Mercosul, bloco que visava uma abertura comercial, diminuição das tarifas alfandegárias e integração das infraestruturas. Ademais, nessa época também, surgia a proposta em 1994 dos Estados Unidos com debates sobre a ALCA, uma área de livre comércio do continente. Houve muitas resistências de países como Brasil por exemplo, temendo que os baixos preços dos produtos norte-americanos levassem ao desemprego e fechamento de indústrias nacionais. Assim a ideia foi abandonada.

Diversos presidentes neoliberais na América do Sul como Carlos Menem na Argentina e Fernando Collor no Brasil por exemplo, implementaram ações liberais, que acarretaram diversos problemas que perduram até os dias atuais. Como os países da região necessitassem de credibilidade para atrair investimentos estrangeiros, tiveram de ganhar competitividade frente a outras regiões, e para isso adotaram políticas de liberalização econômica. Como características dessa destacam-se: o Estado mínimo, pouca intervenção do governo no mercado de trabalho, livre circulação de capital internacional, adoção de medidas contra protecionismos econômicos e abertura da economia para entrada de multinacionais por exemplo.

Descrição

O fracasso nas tentativas neoliberais, somado à corte nos gastos sociais, levaram a um crescimento de protestos feitos pelas camadas populares na Argentina e Bolívia por exemplo. Além disso, a ascensão de Hugo Chávez (Venezuela), Lula ( Brasil) e Evo Morales ( Bolívia) em resposta a esse modelo, deu origem à “onda rosa’’.

Esse termo, originado em um artigo jornalístico é dado à fase onde cresceram governos com matizes de espectro político da esquerda no cenário sul-americano. Diferentemente da cor vermelha, alusiva ao comunismo soviético, adotou-se o rosa como característica de governos sociais-democratas de esquerda. Dentre as ideias defendidas estão a retomada do Estado mais forte e melhoria nos indicadores sociais e econômicos de uma forma geral.

Fatores

O sucesso desse crescimento de governos progressistas nesse período é resultado de três aspectos. Primeiramente é o “Boom das commodities”, cujo crescimento dos preços entre 2000 e 2014, alavancados pela demanda chinesa, permitiria a implementação de políticas de desenvolvimento econômico e sociais na região.

Outro aspecto é a secundarização da região nas políticas externas norte-americanas, cujo foco era mantida no Oriente Médio (Guerra ao terrorismo) e na Europa com alianças políticas.

É somada a isso o descontentamento interno com as políticas neoliberais que permitiram o crescimento de grupos políticos esquerdistas, que se aproveitando do sentimento antiamericano, angariando votos de diversos grupos.

Integração

Durante essa época, além do Mercosul, foi criada a UNASUL (União de Nações Sul-Americanas), estabelecida em 2008 cujos membros eram: Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Equador, Guiana, Paraguai, Peru, Suriname, Uruguai e Venezuela. Dentre os seus objetivos estavam: fortalecer as relações comerciais, culturais, políticas e sociais da região, buscando eliminar as desigualdades socioeconômicas.

Comparativo política sul-americana 2011 a 2018

A onda conservadora

Antecedentes

Em 2014 a China passa por uma crise econômica, o que leva as commodities caírem de preço. Essa desaceleração chinesa tem consequências tanto na diminuição da receita como culminam no enfraquecimento dos governos de esquerda na região sul-americana. 

Ascensão

O crescimento da direita no continente é uma reação à onda rosa, depois de uma década de governos de esquerda na maioria dos países da região. Conhecido como onda azul, esse movimento teve expoentes na Argentina (Maurício Macri em 2015), no Brasil ( Michel Temer e depois Jair Bolsonaro 2018), Peru ( Pedro Kuczynsky), no Chile ( Sebastian Piñera), na Bolívia ( Jeanine Ágñez) e no Equador ( Guillermo Lasso).

Fatores

O crescimento dos governos conservadores teve três aspectos que merecem destaque: o primeiro deles é a questão econômica, conforme vista a desaceleração da China que culminou em uma menor receita, e consequentemente menor margem para ações sociais, além de exigir maior manobra para a distribuição de recursos.

Secundariamente a desilusão com modelos políticos vigentes caracterizada pela corrupção, carga tributária excessiva e os altos gastos públicos que contribuíram para um descontentamento de boa parte da população.

Esse descontentamento, incitado por partidos gerados entre outras classes, fizeram com que a classe média fosse levada a manifestações, acusando a má gestão e forçando a derrubada de governos, como o caso de Dilma Rousseff no Brasil.

Desafios

Diversos foram os desafios que os governos conservadores herdaram nesse período. O primeiro deles é ter todo o aparelhamento contra eles, seja desde o aumento de cargos do funcionarismo público como os programas feitos a boa parte da população. Tanto é, que muitos tiveram que mantê-los tanto para galgar futuros votos como também para manter a popularidade entre vários setores da população.

Há também o difícil movimento de renovação para mídia e escolas, que como é sabido, a ideologia é muito presente e demoraria anos para que houvesse algum tipo de mudança, principalmente nas universidades federais; a mídia/imprensa patrocinada por governos. Ambas são excelentes formas de propaganda ideológica, e tendo o controle de ambos é vital para a disseminação tanto dos fatos como para influenciar votos.

 Integração

No quesito de integração, devido ao seu caráter político ideológico como muitos argumentam, levaram ao esvaziamento de membros no bloco UNASUL criado em 2008. Dos 12 fundadores, seis (6) deixaram o bloco, sendo: Colômbia, Argentina, Chile, Paraguai, Equador e Brasil (retomada em abril de 2024), além da suspensão da República do Peru. Em contrapartida foi criado o PROSUL (Fórum para o Progresso e Desenvolvimento da América do Sul) , em 2019 , substituindo à Unasul, cuja ideia era formação de um bloco sem ideologias e burocracias, cuja Declaração de Santiago “uma estrutura flexível, leve, barata, com regras de funcionamento claras e com um mecanismo ágil de tomada de decisões”. Dos 12 países da região Venezuela, Bolívia e Uruguai, de cunho progressistas foram os únicos a não participarem.

O mapa da política sul-americana

Política em 2024 e os principais desafios

Contexto mundial

O fim da pandemia de Covid-19 mostrou uma divisão política na América do Sul, conforme pode ser vista na tabela, com os atuais presidentes no cargo.

Na ala progressista /Esquerda notam-se Nicolás Maduro, que governa a Venezuela desde 2013 sob uma forma autoritária. Gabriel Boric (Chile) e Gustavo Petro (Colômbia) representam uma ala que busca uma esquerda mais socio-democrata ao estilo europeu, e já mostraram duras críticas à Maduro inclusive. Cabe lembrar que o Chile apresenta uma alternância entre esquerda e direita, e a Colômbia teve seu primeiro presidente esquerdista, essa ala muito associada às guerrilhas. No Brasil, Luiz Inácio Lula volta ao poder depois de um resultado bem apertado com Bolsonaro, mostrando que terá desafios em sua governabilidade. E no Peru Dina Boluarte assume o poder com o impeachment e destituição de Pedro Castillo, e na Bolívia Luis Arce é eleito em 2020, e já mostra disputa política ao ser expulso do partido MAS, o mesmo do ex-presidente Evo Morales, lembrando que as eleições bolivianas serão em 2025.

 Na ala conservadora/Direita quatro governantes na região: no Equador Daniel Noboa herda um país mergulhado num caos de segurança, e está tentando de agir contra o crime organizado; no Uruguai Luis Lacalle Pou, que pela constituição local não pode se candidatar, terá que fazer sua parte para se perpetuar no governo do partido nas próximas eleições, marcadas para esse ano de 2024. No Paraguai Santiago Peña ao assumir em 2023 já provoca atrito com Lula do Brasil ao querer rediscutir a tarifa energética de Itaipu. Ademais o Paraguai é tradicionalmente de direita (exceto no governo de Lugo 2008-2012), lembrando que é o único país da região a reconhecer Taiwan. Na Argentina Javier Milei desbancou a era Kirchner, e apesar de ser colocado como direita, representa uma incógnita ultraliberal, e terá sua governabilidade à prova nos próximos meses, com o fim das férias e volta ao país da classe média e da mais abastada.

O que se pode verificar é que a economia vive atrelada à política, e dita, em muitas vezes a qual lado da balança irá pender, direita ou esquerda. Quando há capital e receita os programas sociais podem ser feitos em abrangência, porém quando há escassez a ideia seria cortar gastos e buscar alternativas para transformar o que se tem em recursos (privatizações). Como diria um sábio escritor e cientista político de Florença chamado Nicolau Maquiavel, “os homens esquecem mais rapidamente da morte dos pais do que a perda do patrimônio”. 

Principais desafios

O mundo atual é marcado pela enorme instabilidade e incerteza geopolítica no mundo, e não é diferente para a região sul-americana. O conflito de Israel contra Hamas mostra bem as divergências ideológicas, tanto de países que condenam o Hamas e apoiam Israel (Uruguai) os que pedem a redução da escalada como o caso do Brasil, assim como a Venezuela que apoia o Hamas.

A instabilidade econômica também é outro tema que gera grande incerteza, apesar das projeções dos dados econômicos pelo Banco Mundial, há o temor de escalada dos conflitos no Oriente Médio (Irã) e com os houthis do Iêmen agindo contra navios no Mar Vermelho. Essas questões além de influenciarem diretamente no preço do barril de petróleo e consequentemente nas economias globais, impactam no frete internacional, haja vista que as rotas que ligam a Ásia à Europa, por exemplo, usam esse caminho para levar matérias-primas para as fábricas dessas localidades.

Outro fator são os conflitos internos, como a recente questão de Essequibo entre Venezuela e Guiana. Embora seja difícil prever os passos do ditador venezuelano, tudo indica que foi uma manobra política para aglutinar a população local, haja vista que com a proposta norte-americana de diminuir o embargo econômico em troca de eleições democráticas, Nicolás Maduro pode ter calculado a possibilidade de um resultado não favorável, e criou esse conflito como estratégia para ganhar reputação interna frente a um inimigo externo, ou simplesmente para dizer que não há clima nem momento para eleições agora.

Ademais outros países passam por crises internas, como o caso do Peru e Equador. A crise peruana é marcada pela queda de braço entre o Congresso e o poder Executivo do país. Marcada por uma onda de corrupção, problemas econômicos, narcotráfico e desemprego, o país está longe de chegar a uma calmaria nos próximos anos. Simplesmente nos últimos 6 anos teve 6 presidentes da república, contendo desde renúncias e destituições. Dina Boluarte, que assumiu o poder com a prisão e destituição de seu antecessor Pedro Castillo, terá pouca governabilidade e certamente enfrentará muitas dificuldades, cujos desdobramentos merecem atenção. A questão equatoriana remonta a uma tríade que culminou na atual onda de violência no país. Politicamente o processo conturbado com que o atual presidente herdou é um dos fatores, cujo antecessor Guillhermo Lasso, acusado de corrupção e para fugir do impeachment aciona a cláusula morte cruzada, que consiste em convocar novas eleições e em contrapartida deixar o cargo, sendo que Noboa possui apenas 1 ano e meio de mandato. A segunda questão é econômica, dado que o Equador se dolarizou e aplicou soluções de mercado para questões chave como a segurança por exemplo, onde boa parte de sua segurança é privatizada, detendo mais segurança privada do que policial. O último ingrediente disso tudo é o aumento do narcotráfico e crime organizado na região, cuja geografia coloca o país como rota de passagem da cocaína ligando a Colômbia e Peru, maiores produtores do mundo. Com essa localização privilegiada os cartéis mexicanos, presentes no continente, usam o Porto de Guaiaquil para remeter suas drogas para os Estados Unidos e Europa, e como o resto da região, já teceu seus domínios e influências nas instituições de Estado.

O Narcotráfico é um desafio para todos os governos sul-americanos. Vide a onda criminosa no Equador, o narcotráfico cada vez mais articulado ganha espaço nos territórios, inclusive já penetrando em setores militares, políticos e empresariais. Assim como os cartéis da cocaína colombiana dos anos 90, muitas siglas disputam seu poder na região, muitas vezes se aliando a já renomados grupos como os cartéis mexicanos e máfia italiana e albanesa por exemplo. No Brasil muitos Estados vêem a disputa acirrada entre as siglas, estas, que dão as cartas tanto em áreas que o governo abandonou como em outras, e que recentemente s até se espalhou para países vizinhos como o Paraguai por exemplo, mostrando que assim como o crime é organizado, as forças de segurança  também precisam se conectar com os países vizinhos.

Na questão econômica, o Mercosul vem apresentando sinais de fraqueza, bloco este que em 30 anos fez poucos acordos comerciais e mostrou a falta de interação de fato da região e a fraca liderança brasileira. Ademais essa lacuna de liderança fez com que cada vez mais o bloco seja ameaçado por tentativas de negociação diretas, como foi o do Uruguai. Soma-se a isso o constante assédio chinês a alguns países, cujo objetivo inevitavelmente é fazer acordos com algum país do bloco diretamente para acertar em tabela no Brasil.

A influência comercial da China no continente mostra a ascensão de Pequim, representando quase a maioria dos países da região como principal parceiro frente aos Estados Unidos. Ademais o projeto da Rota da Seda está inundando alguns países com investimentos chineses em infraestrutura, minando tanto economicamente como politicamente.

Em novembro deste ano, as eleições norte-americanas terão consequências para todo o continente, dado que até o que tudo indica até o momento, será entre Joe Biden (em busca de reeleição) e Donald Trump. A vitória de um ou outro pode representar tanto na influência das próximas eleições sul-americanas, como também será importante para saber qual será a política externa de Washington na região, esta, que tem apresentado um significativo crescimento da influência chinesa.

Finalmente o desafio que mais preocupa é o da polarização política e ideológica na região (e no mundo). Com o uso das redes sociais são disseminadas diversas postagens e matérias infundadas, sem a mínimo preocupação com a explicação do contexto e definições de conceitos, culminando em debates improdutivos e de violência entre todas as partes. Ademais os debatentes cada vez mais cegos e desprovidos de empatia proclamam suas ideologias como se fosse a mais pura verdade, sem ao menos querer debater com argumentos sólidos. Essa será uma dificuldade que qualquer candidato sul-americano terá que lidar com os próximos anos. Afinal, um país polarizado é um país dividido e consequentemente fraco e vulnerável, e isso a quem interessaria mais? A política deve ser sim contestada, discutida e analisada sob todos os pontos de vista e ideologias existentes. Mas quiçá os experts de política das redes sociais e imprensa do mundo atual conheçam um indivíduo francês que vivera em uma turbulência da política de sua época, a Revolução Francesa, e que mesmo sendo preso e torturado na Bastilha, teria dito: “Posso não concordar com o que você diz, mas defenderei até a morte o seu direito de dizê-lo’.

A região sul-americana é um dos principais destinos usados na internacionalização das empresas, seja pela proximidade geográfica, cultural e linguística. Entender a política na região é primordial para ajudar na escolha das estratégias de expansão, e quais serão os principais impactos e oportunidades de cada governo eleito.

 Com experiência de mais de 15 anos em negócios internacionais, desenvolvo consultoria especializada para empresas e startups a alcançarem novos mercados mundo afora. Além disso, através de mentoria “visão Cosmopolita”, auxilio gestores e interessados a expandirem seu mindset global, com temas como: política internacional, geopolítica, culturas e outros temas de relações internacionais. Acredito piamente que o mundo é para todos, e que “longe é todo lugar que você não está disposto a ir”.

Compartilhe este conteúdo

Escrito por Leonardo Dariva

Relações Internacionais

Conteúdos Relacionados

Siga a Ascenda Digital

 

Escrito por Leonardo Dariva

Relações Internacionais

Lorem ipsum dolor sit amet, consectetur adipiscing elit, sed do eiusmod tempor incididunt ut labore et dolore